#ArteviewNaPlateia – Review do espetáculo Não Me Entrego, Não!

Por Léo Braga

Quando vi que os ingressos para Não Me Entrego, Não! estavam à venda, prontamente entrei no site para garantir os meus. Não queria apenas assistir à peça, mas queria ver da primeira fileira. Então, procurei um dia que pudesse estar no Rio e pudesse ver bem de perto. Algumas pessoas falaram que queriam ler meu texto sobre o espetáculo e eu disse que não seria prepotente a ponto de escrever sobre um gênio que vive para os palcos desde muito antes de eu nascer. Pois bem: Aqui estou!

Othon Bastos é daqueles atores que a muitos de nós conhecemos das telas desde que nasceu. Eu, pelo menos, não me lembro da minha vida antes de ver o rosto de Othon na TV. E que honra poder assistir a alguém deste calibre no palco, tão perto de mim!

Não Me Entrego, não! é algo totalmente novo na carreira de Othon Bastos. O ator, que já conta com mais de 70 anos de carreira, tem a coragem (e é preciso ter coragem para o novo) de encenar seu primeiro monólogo, aos 91 anos.

Mas o curioso é que o texto é um monólogo, mas não é um monólogo. Em cena, para além de Othon, temos a sua Memória. A Memória é interpretada muitíssimo bem por Juliana Medela – já premiada por sua participação especial no espetáculo. Ela é quem inicia o espetáculo pedindo (ou quase ordenando) que a plateia desligue o celular – e é claro que tem quem não o faça. E esse pedido é feito graciosamente (e posso dizer que comicamente) apenas com gestos, trazendo inteligentemente a mímica para um palco não circense. Além desse início, Juliana, sendo a Memória, é a responsável por não deixar que Othon Bastos não se perca no texto – que é grande. E joga de maneira impecável com um protagonista completamente disponível e entregue à sua Arte.

Othon Bastos é criança batalhando para ser o representante da turma e precisa recitar um poema. Após a apresentação, sua professora o faz prometer que ele jamais seguirá uma carreira como artista. Sendo assim, o Jovem Othon não quer fazer Teatro. Mas a vida é uma caixinha de surpresas. Othon é Teatro e fugir disso seria fugir de quem é Othon Bastos em sua essência.

Em um texto de 90 minutos, o dramaturgo e diretor Flavio Marinho consegue contar as aventuras e desventuras da carreira do ator, que nos explica em cena como foi parar no teatro por causa de uma montagem de Otelo – O Mouro de Veneza, como foi fazer cinema, totalizando mais de 80 produções na Sétima Arte – e outras profissões pelas quais artistas precisam passar para conseguir atingir seus objetivos. E vale lembrar que é um texto rápido, dinâmico e divertido. Se tivesse 3 horas, você não perceberia o tempo passar e sairia do teatro querendo mais 3 horas.

Ajudam a compor a encenação, a excelente trilha sonora de Liliane Secco, a bela direção de arte de Ronald Teixeira e a delicada iluminação de Paulo Cesar Medeiros.

Casado com a também atriz Martha Overbeck, Othon faz uma homenagem belíssima à esposa, com quem divide a vida há quase 60 anos. De emocionar!

Othon faz tudo isso com tanta vitalidade, que pode dar inveja a muito ator iniciante. Ele tem a mente presente em cena o tempo todo. Tem o corpo disponível e com um tônus que pouco vemos por aí. E uma dicção maravilhosa e aparentemente incansável.

Lá pelo fim da peça, meus olhos estavam inchados e ao aplaudir de pé, ali na primeira fileira, quase não conseguia enxergar aquele que estava a poucos centímetros de mim. E quando eu falo em aplaudir de pé este espetáculo, falo em aplaudir de pé como antigamente: pela obra prima que se vê no palco – e não pela convenção banalizada do aplaudir de pé a qualquer obra. O que se vê é – repito – uma obra-prima.

A vida de Othon se confunde com a história do Teatro, cinema e televisão nacionais e Não me entrego, não! é a prova de que o artista de teatro, para ser artista, não pode – e não vai – se entregar, não! 

SERVIÇO

ATÉ 27 DE OUTUBRO DE 2024

Sextas às 20h, Sábados às 19h, Domingos às 18h

Teatro Vanucci – Shopping da Gávea – RJ